O rio que não é rio e as cheias seletivas (parte 2 de ...)


 

Quem é do sul do Brasil, se nunca ouviu, em algum momento da vida vai ouvir falar em "Cheias de São Miguel" ou "Enchentes de São Miguel". Se o arcanjo tem alguma coisa a ver com isso eu não sei, mas o fato é que setembro, em cujo dia 29 a Igreja instituiu o dia de São Miguel, é um mês historicamente chuvoso na parte meridional do país. Assim como as Cheias de São Miguel, o senhor El Niño também é um visitante não eventual, todos os anos aparece. Se não me engano ele até tem relação com as chuvas miguelinas. Claro, o evento climático veio mais pesado este ano, mas ninguém pode dizer que se surpreendeu com a sua ação. Ninguém? O governador gay que não quer ser o gay governador, e que é fã da Ivete Sangalo¹, Eduardo Leite, disse. E não só disse como entrou em debate em rede nacional com o jornalista André Trigueiro, que, para azar do governante, entende do assunto. E foi desmascarado pelo instituto MetSul, que em nota oficial disse que emitiu vários alertas sobre a gravidade dos eventos climáticos que se avizinhavam. 

Se estendermos um pouco a abrangência do debate, podemos perguntar se alguma ação prévia foi ou está sendo feita para minimizar os efeitos da estiagem que logo ali na frente vai acometer o Rio Grande do Sul. Isso também não será novidade. Sem querer validar a profecia que o mar vai virar sertão e o sertão vai virar mar, aposto algumas fichas que a partir de novembro ou dezembro teremos racionamento de água em Bagé, reportagens da globinho mostrando grandes áreas em que corriam caudalosos rios (lagos?) e que agora só tem terra rachada etc. Alguma novidade? Não, assim como também não é novidade que o Leite não fez e não vai fazer nada preventivamente, como também não fizeram os que o antecederam desde que essas coisas começaram a se tornar frequentes por aqui. E por que não fazem nada? Resposta difícil, mas tenho algumas hipóteses. 

Quando era piá, volta e meia ouvia falar que enterrar cano não dá voto. A frase era usada para explicar o motivo por que nunca existiu no Brasil uma política efetiva de saneamento. Arrisco dizer que a explicação se adapta à falta de investimentos em prevenção dos eventos climáticos extermos que ocorrem com frequência tal que já não podem ser chamados de eventuais e muito menos causar supresa nos governos. Ocorre que se não houver problema, não vai haver notícia, e se não houver notícia não vai haver possibilidade de exploração política dos eventos. Por outro lado, fica bem pra imagem de qualquer governante aparecer de colete da defesa civil, prestando auxílio às pessoas prejudicadas pelas tragédias. Além disso, a decretação de estados emergenciais (calamidade e outros), sempre oferece boas possibilidades de entrada de recursos não previstos (ou bem previstos), que, em face da necessidade, podem ser usados com grande flexibilidade. Estou dizendo que há desvio de verbas nessas situações e que alguns agentes políticos se aproveitam do sofrimento do povo para se beneficiar, inclusive engordando as suas contas bancárias, estejam elas no braZil ou em alguma offshore por aí? Não, claro que não, não seria imprudente e leviano a tal ponto. Mas é fato que as formas de controle da aplicação dos recursos se afrouxam em situações excepcionais. 

Com isso, a mim parece óbvio que tão logo tenhamos reequilibrado minimamente a situação dramática provocada pelo excesso de chuvas, passaremos a nos dedicar a "resolver" os problemas causados pela falta delas. Espero que o nosso Eduardo não se diga surpreso com a estiagem. 


Continua...

*Imagem de destaque: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/eduardo-leite-nao-sabia-de-nada-ou-tentou-enrolar-por-moises-mendes/. Acesso em 5/10/2023.

¹Texto atualizado com a contribuição do Lucas Fernando Eickhoff.

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