Ano novo, vida nova, pero no mucho...
O terceiro milênio começa de fato em 2001, já que não houve um ano zero na contagem do calendário oficial do mundo ocidental. Mesmo assim, a virada de 1999 para 2000 é o evento que se inscreve no imaginário popular como a marca de um novo tempo. Em termos práticos, nada mudou, não houve o tal bug do milênio, os computadores não pararam, o mundo não acabou. Tudo começou a mudar mesmo em um meio de ano, 16 anos depois, especificamente em abril, num dia 17. 17 que, a propósito, viria a ser um número fundamental nos acontecimentos recentes do Brasil, ou melhor, do braZil. Para quem não tem boa memória, e aqui já digo que mesmo quem tem excelente memória encontra dificuldades para acompanhar os fatos, lembro que 17 de abril de 2016 é a data do golpe que pouco tempo depois derrubaria uma presidenta legitimamente eleita pelo voto popular por crimes que ela não cometeu. Não custa lembrar que a falta de diálogo com o congresso nacional e outras instituições, e mesmo o afastamento das bases populares que legitimaram o seu governo pode ser qualquer coisa, desde falta de habilidade política até traição, mas não é crime, o que significa dizer que a presidenta Dilma poderia, e alguns dirão que deveria, ter sido tirada do poder pela mesma força que fez com que ela chegasse lá: o povo. Pessoas implicantes, como eu, possivelmente dirão que ela sairia de qualquer jeito ao fim do mandato, porque não poderia mais se reeleger, mas a figura está posta e é esta: Dilma chegou à presidência pelas mãos do povo e deveria ter saído de lá pelas mesmas mãos. Mas não foi isso o que aconteceu.
Pretendo falar um pouco, nos próximos dias, sobre os eventos que estão na causa imediata do governo golpista de 2016 e do que veio depois, que são as conhecidas Jornadas de Junho, que completam 10 anos agora. Mas por enquanto trouxe essa memória por outra razão. Lembrando apenas que a outra face importante do número 17 é a sigla do famigerado PSL, partido alugado por Jair Bolsonaro e seu exército do mal para viabilizar o projeto político presidencial, numa sequência que, analisada de frente para trás, chegará às Jornadas de Junho.
Voltando a pensar em festas de fim de ano, o natal de 2022 veio com a esperança de uma grande mudança e a expectativa pelo reveillón de 2023 era muito mais pela posse de Lula - ou pelo fim do desgoverno fascista de Bolsonaro - do que pelas tradicionais comemorações de ano novo. Tradicionais, diga-se, no âmbito que se estende até algumas classes médias, porque para a grande massa da população a luta pela sobrevivência em 31 de dezembro é a mesma de 1º de janeiro. Mas, de maneira geral, a posse de Lula dominava as conversas no país de norte a sul. Por um lado positivo, que apontava para o começo da saída do período mais tenebroso da história do país, mas também com uma grande apreensão, porque os imbecilizados campistas urbanos da frente dos quartéis ameaçavam não deixar o novo governo começar. Mas ele começou. E começou com emoção, subida de rampa histórica, discursos tomados de esperança, recriação e criação de ministérios importantes, festa nas ruas etc. Uma semana depois, porém, a coisa começou a complicar e a partir daí a fabricação de escândalos retomou a sua linha de produção industrial.
Como eu mais ou menos disse, a conversa de hoje é como que preparatória a uma análise que quero tentar fazer sobre a origem mais próxima do horror que o país se encontra hoje. Não, não tenho ilusão de que não está um horror, para isso no mínimo os bolsonaros deveriam estar encarcerados, e quando digo bolsonaros não me refiro apenas à família miliciana, mas a todos aqueles e aquelas cujos crimes já estão consubstancialmente comprovados e que só andam soltos pela rua por conta da quase falência das nossas instituições republicanas e por motivos que não gostaria de pensar que são possíveis, mas penso: um pacto pela governabilidade, que pode assumir o sonoro nome de anistia. E não dá pra esquecer que não é possível imaginar algo realmente bom para o povo com alckimins e juscelinos transitando nas mais altas esferas de poder. Mas, retomando o fio da meada, a ideia deste texto é apenas fazer uma pequena lista, nem de longe exaustiva, antes apenas exemplificativa, que comprova que a fantástica fábrica de bombas de fumaça continua ativa e funcionando a pleno vapor, apenas que agora não operada por agentes ligados ao governo, como durante o desgoverno fascista, mas por outras forças que se enfrentam nesse nefasto jogo de poder que é a conjuntura política brasileira. Como sei que o meu muito restrito público leitor prima pela inteligência superior, vou me limitar, neste momento, apenas a uma lista mesmo, deixando para vocês a rememoração dos fatos.
Então vejam lá os fantasmas que rondam o hamletiano (talvez melhor seria dizer kafkiano) reino brasilis:
Mauro Cid, Anderson Torres, Arthur Lira, Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, Augusto Heleno, Braga Neto, Flávio, Carlos, Eduardo, Jair e Michelle Bolsonaro, Gabriela Hardt e família (pai), TRF4 e seus desembargadores, marco temporal, arcabouço fiscal, bancadas evangélica e da bala, ruralistas, Ronaldo Caiado, CPI do MST, Ricardo Salles, Damares Alves, Dom e Bruno, Marielle, troca de favores pela aprovação da reformulação ministerial, centrão, corrupção no futebol, Fabrício Queiroz, joias árabes, Nélson Piquet, racismo, lgbtfobia, misoginia, rearticulação da extrema direita para as eleições municipais, crimes da pandemia, crimes nas e das forças armadas, Nunes Marques e André Mendonça, desarticulação e esvaziamento dos ministérios ligados ao meio ambiente e aos povos originários, Banco Central, Roberto Campos, juros, Pterobrás, combustíveis, Mano Menezes (ops...), matriz energética, garimpo, mineração, rede Globo exaltando evangélicos e ruralistas (novelas das 7 e das 9), CNN, Jovem Pan, os novos amigos Luciano Hang e Silas Malafaia etc. etc. etc.
Imagem de destaque copiada de: https://www.brasildefato.com.br/2021/10/04/bolsonarismo-tem-raizes-em-um-brasil-construido-a-margem-do-estado-afirmam-pesquisadores. Acesso em 9/6/2023.
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