ATUALIZADO - A direita inrachável, a vitória do PGR e a reprodução dos ratos



 



No Brasil não existe uma esquerda. Na verdade uma esquerda não existe no mundo. Uma, neste caso, é numeral. Existem muitas esquerdas. No Brasil talvez em número maior do que no mundo. Tem a esquerda feminista, tem a esquerda antirracista, tem a esquerda da luta pela terra, tem a esquerda da luta pela moradia, tem a esquerda que reproduz Gramsci (essa, segundo Olavo de Carvalho, é a mais perigosa), tem a esquerda da periferia, tem a esquerda da Academia, tem até a esquerda festiva e a esquerda que nem sabe o que é esquerda. Nisso tudo, a causa principal da esquerda ortodoxa, a luta anticapitalista, fica prejudicada. A esquerda é complicada.

A direita, pelo contrário, é um bloco (quase) monolítico, cujo único interesse está no binômio dinheiro/poder. E só é quase e não absolutamente monolítico porque dinheiro e poder em alguns raros momentos da história não andam abraçados, e aí pode dar alguma briguinha, mas nada que um bom conchavo e proveitosa troca de favores não resolva em pouco tempo. Não há racha nenhum na direita. Nunca! As tensões internas, quando ocorrem, são invariavelmente provocadas por egos fora de controle e/ou por gente que vai com muita sede ao pote, Fernando Collor como exemplo clássico. Bolsonaro apoiou Nunes ou Marçal no primeiro turno? Pouco importa. Um é de extrema direita e o outro é de ultradireita. E vice-versa. E o Messias é simplesmente o que o próprio nome denuncia: o messias da ultradireita messiânica.

Tenho visto desde ontem algumas análises que dizem que o PL, de Jair Bolsonaro e Valdemar da Costa Neto, perdeu espaço ao fim do primeiro turno das eleições. Discordo totalmente! E para concordar com a minha discordância basta passar pelo mapa eleitoral e ver quantas comunidades elegeram gente do PL para os governos e, principalmente, para as Câmaras municipais. O PL passou o rodo. E isso que ainda falta o segundo turno.

Outro erro muito comum é dizer que há uma nova direita. Não há. O que há é um recrudescimento de certos setores da direita monolítica em torno de pautas extremistas. E isso é um fenômeno mundial. Em que parâmetro se pode estabelecer, por exemplo, a diferença de práticas entre o governo Alckmin em São Paulo, que manda baixar a porrada nos estudantes que ocupavam as escolas em 2015/16, e o governo Bolsonaro, com todas as atrocidades que cometeu ao longo de quatro anos? O fato de Geraldo Alckmin ter virado "socialista" e ter se associado à luta para barrar Bolsonaro em 2022 apaga esse passado? E vejam que nos dois exemplos quase aleatórios há um personagem comum em posição de destaque: Alexandre de Moraes. O ministro, herói da hora de certa esquerda, que tem sido louvado como o garantidor da democracia no país, é o mesmo que como chefe da segurança comandou a pancadaria da polícia militar contra os estudantes paulistas. Sempre bom lembrar que esse tipo de procedimento firme (eufemismo óbvio para violência e autoritarismo) é que levou o grande restaurador da ordem ao STF pelas mãos do golpista Michel Temer. O lema sessentista "não confie em ninguém com mais de 30" pode muito bem ser adaptado a essa realidade brasileira para alertar que não se deve confiar em ninguém que veio da direita. O futuro dirá.

Entretanto, um sujeito que em tese não é de direita nem de esquerda, e que não é (ou não deveria ser) sequer agente político, é o grande vencedor do primeiro turno das eleições municipais: Paulo Gonet, o Procurador-Geral da República. Quando decidiu sentar no processo do Golpe de 8 de Janeiro, a fim de não prejudicar candidatos bolsonaristas, o PGR, por via reflexa, tornou mais fácil o caminho da extrema direita país afora e país adentro. Certamente o chefe do MPF, ungido por Lula, deve ter estourado uma champanha ontem à noite para celebrar o acerto da sua decisão. Candidatos bolsonaristas se proliferaram como ratos e tomarão de assalto (alguns em sentido literal) os parlamentos municipais a partir de 2025.

E assim chegamos a eles, os ratos. Não ao grande livro de Dyonelio Machado. Nem aos roedores, um tanto nojentinhos, é verdade, que desempenham um papel fundamental na cadeia ecológica. Falo dos ratos que andam em duas patas, ops, duas pernas, e que têm sobrenome famoso. Jair Bolsonaro, o Renan, é o vereador eleito com o maior número de votos em Balneário Camboriú. E Carluxo, cuja prisão iminente foi anunciada dezenas de vezes por influenciadores progressistas nos últimos tempos (sim, ainda há quem acredita nas instituições, ou finge que acredita...), é o vereador mais votado da Cidade Maravilhosa. 

E outros ratos, que comeram à farta nas cheias, saíram dos esgotos tranquila e descaradamente ontem. Nas façanhas que só o povo do continente de são pedro consegue realizar, o prefeito da enchente esteve a poucos votos de se reeleger no primeiro turno, um fato bastante raro. Não passou direto por detalhe, e agora resta ao povo da capital do RS decidir se quer pelo menos ter a perspectiva de retomada de um tempo em que Porto Alegre era reconhecida mundialmente como a cidade do Fórum Social Mundial e que recebia delegações de países primeiro-mundistas para estudar o Orçamento Participativo, ou se quer seguir afundado nas águas contaminadas, metaforicamente, da política minada de ratos e, literalmente, dos esgotos despejados no rio que virou lago para atender os interesses da Melnick. Você decide!

*Imagem de destaque: montagem feita pelo autor a partir de imagens obtidas em https://jornalistaslivres.org/carta-ao-pai-bolsonaro-de-quatro-zeros-a-esquerda/ e https://gauchazh.clicrbs.com.br/politica/noticia/2024/07/em-ato-com-bolsonaro-pl-confirma-apoio-a-melo-e-indicacao-de-vice-clz3cwnzy007v01ew822p48tg.html. Acesso em 7/10/2024.


Atualização feita em 10/10/2024: https://iclnoticias.com.br/malafaia-pazes-bolsonaro-ri-bolsominions-marcal/

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